CONGRESSOS NACIONAIS DE CENTROS
DE FORMAÇÃO DE ASSOCIAÇÃO DE ESCOLAS
23 de Fevereiro de 2000
Início da Recepção aos Participantes
Sessão de Abertura do Congresso
Augusto Santos Silva – Secretário de Estado da Administração Educativa*
Ernestina Sá – Coordenadora Nacional do Programa FOCO
Jorge Martins – Director Regional de Educação do Norte
Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua
Maria Ana Pacheco – Coordenadora Regional do Programa FOCO
Graça Barros – Vereadora da Educação da C. M. Maia
César Rocha – Director do Centro de Formação da Maia
1º Painel (Debate)
A formação em análise – um olhar distanciadamente próximo
-António Rodrigues
-Fernando Ilídio
-Nuno Lameiras (moderador)
-Vito Carioca
24 de Fevereiro de 2000
2º Painel (Debate)
O processo formativo –projectos de formação
-“António Nobre” (Grupo)
-Afonso Magalhães (moderador)
-Ana Cristina
-Augusto Cadilhe
-Matias Alves
Apresentação do Livro: “ Teorias e Práticas da Formação…“ de Manuel Matos
3º Painel (Debate)
Organização e Funcionamento – criando cadeias de complementaridade
-Ademar Santos
-José Brito
-Manuel Dias
-Manuel Monteiro (moderador)
O Congresso no terreno: percursos de formação/ visitas de estudo
Reencontro no Forum da Maia – Mostra de Materiais Pedagógicos
25 de Fevereiro de 2000
Apresentação de Propostas – Workshops (nos 2 auditórios)
Apresentações de Propostas em Plenário- debate e votação
Conclusões Gerais do Congresso
Sessão de Encerramento
Guilherme de Oliveira Martins – Ministro da Educação
Vieira de Carvalho – Presidente da C. M. da Maia
III Congresso Nacional dos CFAE’s
CONCLUSÕES
Enquanto organizações vocacionadas para a formação contínua e a permanente qualificação dos agentes educativos (e, através destes, dos estabelecimentos de educação e ensino), os CFAE’s constituem observatórios privilegiados das realidades e tendências mais marcantes do sistema educativo português e dos territórios em que se inserem. O capital de experiências, de percepções e de conhecimentos acumulados pelos Centros ao longo dos anos – e que o III Congresso Nacional dos CFAE’s, uma mais vez, evidenciou – representa uma preciosa mais valia de consciência e entendimento dos problemas e desafios com que, a nível educacional, o país se acha confrontado. Infelizmente, a fragilidade institucional e organizacional das associações que lhes servem ou deveriam servir de suporte e enquadramento tem tido como resultado a multiplicação dos papéis que os Centros são chamados a desempenhar, afectando a consolidação, projecção e disseminação desse capital de sabedoria, cuja relevância, por isso, continua ainda em larga medida por reconhecer.
O III Congresso Nacional dos CFAE’s, pelos documentos de reflexão que suscitou e pelas preocupações expressas nas inúmeras propostas que foi chamado a discutir, passará certamente a representar um marco no processo de consolidação identitária e de reorientação estratégica dos Centros de Formação.
Neste sentido, os CFAE’s, reunidos no Forum da Maia no seu III Congresso Nacional, reconhecem e proclamam:
1º A necessidade urgente de ser estabelecido um quadro legal e de serem definidos dispositivos processuais que, com a indispensável maleabilidade, possam assegurar a clarificação e favorecer o reforço da matriz institucional e organizacional das Associações de Escolas que suportam os Centros de Formação no quadro do desenvolvimento dos contratos de autonomia das escolas e agrupamentos de escolas e numa perspectiva de efectiva descentralização da administração educativa e de territorialização das políticas educativas;
2º A necessidade de ser garantida e/ou reforçada a representação e participação dos CFAE’s nas diversas instâncias de reflexão/articulação/decisão das políticas educativas em geral e das políticas de formação em particular, nomeadamente, entre outras, no Conselho Nacional de Educação, no Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua, no Conselho de Formação Contínua e nos Conselhos Locais de Educação;
3º O imperativo estratégico de progressiva e dinâmica compatibilização dos Planos de Formação dos Centros com os Projectos Educativos, os Planos de Actividades e os Planos de Formação das Escolas associadas e os Planos Individuais de Formação dos diferentes agentes educativos, numa lógica de concepção e desenvolvimento dos processos formativos que, claramente, favoreça a valorização pessoal e profissional dos formandos e a qualificação das escolas e dos ambientes educativos;
4º A necessidade de um maior investimento dos CFAE’s nos processos de avaliação interna e externa da formação e do seu impacto nas escolas, através da construção, experimentação, aferição e progressivo desenvolvimento de modelos e dispositivos que promovam, entre outras, as dimensões retroactiva e projectiva da avaliação, encarada esta sempre como uma das componentes fundamentais de qualquer processo formativo.
Para além dos princípios enunciados, o III Congresso Nacional dos CFAE’s decide ainda acolher genericamente como suas as reflexões e propostas constantes dos documentos de trabalho “Identidade, Autonomia e Mudança”, do director do CF da Maia, “Formação Contínua e Autonomia”, dos Centros de Formação do distrito de Braga, “O desenvolvimento dos CFAE como Centro Local de Recursos”, dos Centros de Formação da cidade do Porto, “A Construção do Processo Formativo” , da directora do Centro de Formação António Sérgio, “Fundamentos e Estratégias para a Organização dos Planos de Formação das Escolas”, da directora do Centro de Formação de Lagos e “A Formação Contínua Que temos? Que queremos? Que merecemos”, do director do Centro de Formação de Marco de Canaveses, recomendando vivamente a todos os Centros de Formação do país a leitura e discussão atentas destes documentos.
Finalmente, o III Congresso Nacional dos CFAE’s saúda e felicita calorosamente
– a Comissão Organizadora do Congresso e o Director do Centro de Formação da Maia pela excelência do acolhimento e das condições de trabalho proporcionadas aos congressistas;
– os moderadores dos diversos painéis, pela serenidade, elevação e eficiência com que conduziram e coordenaram os trabalhos;
– os autores de todos as comunicações, propostas e documentos apresentados, que, com as suas reflexões, largamente contribuíram para o êxito deste Congresso e para o reforço da credibilização dos CFAE’s.
Maia, 25 de Fevereiro de 2000
III CONGRESSO NACIONAL DOS CENTROS DE FORMAÇÃO DE ASSOCIAÇÕES DE ESCOLAS
“Em busca de Identidade à procura de Autonomia”
Forum da Maia 23, 24 e 25 de Fevereiro de 2000
IDENTIDADE, AUTONOMIA E MUDANÇA
A Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) estabelece, no seu artigo 2º que « o sistema educativo responde às necessidades resultantes da realidade social, contribuindo para o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos, incentivando a formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários e valorizando a dimensão humana do trabalho».
Se entendermos que um dos referenciais de qualidade das escolas é constituido pela satisfação das necessidades resultantes da realidade social, tal como é referido na LBSE, então o professor/educador tem a seu cargo promover competências que ultrapassam, nitidamente, os âmbitos da sua formação académica inicial e se expandem até à formação humana e cívica, à comunicação interpessoal, relacionamento emocional, espírito crítico, mediação de conflitos, etc. Alguns autores entendem mesmo a função do professor/educador como a de um mediador do processo educativo que se situa entre a criança/aluno e o real, disponibilizando-se para a ajudar a lidar com as situações provocadas ou escolhidas de forma positiva e geradora de êxito. Consideram, assim, qualidades requeridas para a “arte de ensinar” as seguintes:
1 – Uma base de conhecimentos declarativos bem organizados e elaborados;
2 – Um conjunto de competências básicas automatizadas que permitam fluidez no trato e no trabalho;
3 – Conhecimento amplo de estratégias sobre “como ensinar”;
4 – Personalidade equilibrada, afectiva e socialmente;
5 – Informação o mais completa possível sobre o acto de pensar;
6 – Preocupação de educar para a vida;
7 – Saber dialogar com os alunos e entusiasmá-los pelas actividades sugeridas.
(Feuerstein (1980)
Se atentarmos bem nesta lista de requisitos, só um deles se refere à componente mais forte da “formação inicial”: “Os conhecimentos declarativos organizados e elaborados”. Outro autor, (Shulman (1986), porém, discrimina, neste âmbito, alguns aspectos que nem sempre são objecto de aprendizagem na formação inicial:
Conhecer o conteúdo das matérias programática e sua organização;
Descobrir os aspectos de mais fácil compreensão e porquê;
Dispôr de exemplos e analogias facilitadoras;
Elaborar um currículo com coerência conceptual e formativa.
Assim entendida, nem a formação inicial é já suficiente para a constituição dessa base de conhecimentos declarativos que o docente deve possuir.
Todos os restantes requisitos (competências) ficam, a maior parte das vezes, ao cuidado do candidato a professor que vai retirando do “senso comum” da classe e das próprias experiências negativas algum saber prático que consolida empiricamente no exercício da profissão. Geram-se, assim, hábitos conservadores e sem qualquer justificação racional e didáctica, muito difíceis de alterar, porque são os melhores que o docente encontrou para resolver problemas quotidianos que teve de enfrentar de mãos vazias e sem aviso prévio. Estes primeiros insucessos na carreira, modelam muito negativamente o professor e são, provavelmente, responsáveis pelo medo que muitos docentes manifestam em empreender um trabalho cooperativo (em se exporem) e pelo baixo nível de auto-estima que os torna extremamente vulneráveis e susceptíveis no relacionamento com os colegas e mesmo perante os alunos.
Estes resultados ilustram os déficits da formação inicial dos professores onde não se abordam com suficiente profundidade e perspectivação prática as competências didácticas que vão ser exigidas aos professores na assunção dos seus diversos papéis escolares.
É precisamente nesta “área de ninguém “ que os centros de formação contínua encontram campo de trabalho e sentido para a sua intervenção junto das escola e dos professores.
Mas, se a formação inicial é, por vezes, deficitária, a formação contínua e, neste contexto, a actividade dos CFAE’s ganha mais sentido e identidade numa significativa confluência de factores:
1 – As escolas têm de viver para a comunidade social em que se inserem. Ao professor cabe a tarefa de “ler” a realidade envolvente e trazê-la para dentro da escola, para análise. Esta perspectivação aproxima teoria e prática, propiciando uma boa comunicação entre professor e alunos. Neste caso, os professores não podem ser meros “debitadores” de saberes, mas organizadores e mediadores de aprendizagens;
2 – Uma escola é uma organização que vai evoluindo e construindo um estilo de vida. Os professores são intérpretes e agente activos dessa expressão de vitalidade institucional. É indispensável que criem formas de colaboração efectiva para construirem um “clima de trabalho” satisfatório e motivador pelo qual se interajudem e “suportem” mutuamente.
3 – O êxito dos alunos é também o do professor. Deve o professor preocupar-se em criar condições de êxito aos seus alunos para que o trabalho em conjunto seja mutuamente gratificante. A função educadora exerce-se em todos os momentos e circunstâncias, pelo que as qualidades humanas do professor estão em permanente evidência;
4 – A execução curricular tem de ser dimensionada para o contexto dos alunos e as possibilidades da escola. A intersecção destes dois factores é fonte de inúmeras inovações que contribuem para a optimização da relação eficácia / esforço / satisfação quer de alunos quer de educadores. Se as escolas privilegiarem a fidelidade aos seus utentes (alunos e famílias), diminuem as disparidades entre objectivos curriculares e competências consolidadas pelos alunos, aumentando, assim, as condições de êxito e a satisfação com os resultados conseguidos.
Pelo que vem consignado na LBSE, como referimos, a organização e vida escolar deve, prioritariamente, responder às solicitações do contexto social em que se insere e não às hierarquias político-administrativas que as tutelam, financiam e controlam. E esta é uma área dilemática e sensível com que professores, escolas e nós próprios hoje nos confrontamos. Do posicionamento das escolas nesta tensão de fidelidade ao seu meio ou ao poder instituido resulta tornarem-se servas fiéis da vontade da(s) tutela(s) ou atentas indagadoras da realidade envolvente, procurando buscar nesta novas perspectivas de actuação eficaz e renovação interna para melhorar o seu papel social e a qualidade do serviço prestado.
A assunção da autonomia pelas escolas condu-las a esta mudança de perspectivação estratégica e ao dimensionamento do seu projecto de trabalho (Projecto Educativo), tendo mais em conta a realidade que as envolve do que a tutela hierárquica de que dependem. Aliás, a escola será, então, responsabilizada pela execução do seu projecto, gerando um referencial forte de avaliação interna pelo qual aferirá a sua própria qualidade e não dependendo tanto de referenciais externos e universais que medem pelo mesmo padrão realidades efectivamente diferentes e não uniformizáveis.
Mas, à semelhança do que se passa com as pessoas, a autonomia das instituições também se constrói e consolida, exigindo clareza nos objectivos a alcançar e avaliação das hipóteses de sucesso existentes, atentas as circunstâncias em que nos movimentamos.
Não se pode ensinar a viver livremente se se é escravo; a ser responsável, quando se não é capaz de escolher e decidir; a ser autónomo e solidário, quando se é dependente e egocentrado.
Não se pense, contudo, que podemos assumir um discurso desculpabilizante. Somos solidários e co-responsáveis neste processo de construção de autonomia.
Como as escolas não são só edifícios físicos ou estruturas administrativas, mas fundamentalmente pessoas que activamente contribuem para a realização dos ideais educativos que escolheram ou assumiram como “bons”, uma das funções significativas dos CFAE’s consistirá na formação dos docentes e outros responsáveis educativos no sentido de desenvolverem competências e formas de intervenção institucional conformes com o modelo de funcionamento autonómico e os respectivos processos de avaliação orientados para a tomada de decisões concretas.
A assessoria que os CFAE puderem prestar às escolas suas associadas serão de grande significado para estas e oportunidades excelentes de credibilização perante todos os agentes educativos. Se quiserem afirmar-se como estruturas de formação credíveis e prestigiadas os CFAE’s têm de se preparar desde já desenvolvendo um potencial de inovação que dentro de algum tempo lhes será muito útil na mudança que as escolas são levadas a efectuar para que a inovação passe das intenções à prática.
Para que as escolas se autonomizem e evoluam em qualidade é indispensável que melhorem a comunicação interna, dinamizem formas de cooperação entre os professores e criem uma suficiente motivação interna e bom “clima institucional” para que todos se sintam implicados e exista satisfação pessoal de todos os seus profissionais. A formação organizada pelos centros pode e deve contribuir para disseminar novas formas de promover aprendizagens nos alunos, de organizar actividades educativas na escola e de captar a colaboração activa e efectiva das famílias na partilha dos ideais educativos. A respeito de todos estes aspectos existe saber constituido que pode servir de ajuda à actuação de muitos profissionais e instituições. Os CFAE podem constituir boas bases logísticas, centros de recursos privilegiados para o estudo de problemas, a reflexão e disseminação de experiências já realizadas e passíveis de transposição para novos contextos. A prática do estudo e investigação deve constituir uma das marcas do trabalho dos CFAE que estão melhor posicionados do que qualquer outra estrutura de formação para aproximar teoria e prática, retirando daí a máxima eficácia da formação promovida.
Esta confluência de factores e situações requer, da nossa parte, um esforço de clarificação, uma busca de identidade, que nos permita, sabendo quem somos, definirmos os caminhos a percorrer rumo a uma autonomia consolidada.
O DISPOSITIVO DE FORMAÇÃO DOS CFAE’s
1. Tendo em conta a sua configuração jurídica e as concepções subjacentes à sua criação, os Centros de Formação de Associação de Escolas (CFAE) são entidades formadoras cuja “natureza” assenta nos seguintes aspectos:
um carácter associativo; este é, talvez, o seu traço mais profundo e inovador, pelo menos a nível organizacional. O associativismo está presente na constituição dos centros de formação de associação de escolas e é pressuposto do seu funcionamento (condiciona o seu funcionamento). Este associativismo está baseado numa lógica territorial. (concelhio e, nalguns casos, intermunicipal).
uma lógica de descentralização concomitante com a construção da autonomia das escolas. Diríamos mesmo que há toda uma articulação dialéctica em que a autonomia das escolas e a autonomia dos CFAE’s se pressupõem, estimulam e crescem (ou fenecem) conjuntamente.
uma intervenção organizacional decorrente das necessidades e dos problemas das escolas. Os CFAE’s são uma estrutura organizacional de intervenção local.
uma acção de concertação. A intervenção dos CFAE’s deve promover e estimular a concertação de projectos e iniciativas de formação propostas, construídas e dinamizadas pelas escolas.
2. A conjugação destas características identitárias, apesar de pressupor, permitir e promover a diversidade e a contextualidade de cada projecto e de cada CFAE (a sua identidade específica e singularidade própria), não pode deixar de enformar a construção dos dispositivos de formação dos CFAE’s.
No entanto, este primeiro ciclo de existência dos CFAE´s, desde a sua criação até à presente data, aponta para um certo enviesamento destes aspectos e para uma certa perversão da sua “natureza”:
em primeiro lugar, o carácter associativo, embora forte na génese dos CFAE´s, rapidamente se perdeu. E perdeu-se porque pressupunha e reclamava um esforço de construção de uma cultura de relação comunitária (reticular), cooperativa, participativa e sinérgica entre as escolas que nunca existiu no nosso sistema educativo;
em segundo lugar, a lógica de descentralização foi desvirtuada não só pela instrumentalização dos CFAE´s ao serviço de um poder central ainda baseado na reforma por decreto, como também pelas dificuldades emergentes no próprio processo de construção da autonomia das escolas e da introdução de novos quadros normativos. Às dificuldades da construção autonómica das escolas acrescem as nossas próprias dificuldades, posicionados que estamos numa tensão de fidelidade aos nossos associados ou às diferentes tutelas que nos financiam e controlam;
em terceiro lugar, os CFAE´s serviram os mecanismos do mercado de formação dirigida quase exclusivamente para os professores enquanto profissionais isolados e descontextualizados (acentuando o seu isolamento e individualismo), esquecendo a dimensão organizacional e colectiva inerente à formação contínua. Convém não esquecermos que, acima de tudo, somos centros de formação de associação de escolas (e não centros de formação de associação de professores);
em quarto e último lugar. Esquecendo a sua matriz associativa, o seu carácter descentralizador, a sua dimensão organizacional, a oferta de formação dos CFAE´s, funcionou de forma supletiva em relação aos projectos de formação das escolas, acentuando a sua – da formação e dos CFAE’s – exterioridade, em vez de acarinhar propostas, promover projectos, concertar sinergias, incrementar práticas de interacção social.
3. Neste sentido, para além de outras dimensões, é urgente repensar o dispositivo de formação dos CFAE´s em relação a dois aspectos que têm um papel determinante:
a construção do projecto de formação
a participação dos diversos intervenientes
Em relação à construção do projecto de formação, os princípios acima elencados implicam as seguintes consequências:
tendo em conta o carácter associativo, o projecto de formação deve emergir dos interesses, necessidades e problemas de um determinado grupo de escolas que pretendem intervir num território de um forma intencional e concertada;
o projecto de formação deve estar ao serviço da construção da autonomia das escolas, sem a qual o CFAE não terá qualquer identidade e pertinência, servindo apenas para relocalizar o poder central através de formas de controlo mais subtis;
os problemas das escolas e dos colectivos devem ter prioridade em relação aos professores atomística e abstractamente considerados, induzindo as dinâmicas de formação a partir dos contextos profissionais, culturais e organizacionais que são as escolas;
os projectos de formação devem anular todo o carácter de supletividade relativamente às escolas e aos seus projectos de formação, o que aumenta a sua artificialidade e instrumentalização e diminui a sua função de construção da autonomia, associação e redes de solidariedade entre as escolas.
No que respeita à participação dos diversos intervenientes, é preciso proceder a uma profunda reconfiguração:
os formadores não podem continuar a ter um papel determinante na definição da oferta de formação, concebendo a priori e em abstracto acções de formação às quais escolas e professores se submetem, incumbindo-lhes (aos formadores), antes, no caso dos CFAE’s, uma função fundamental na construção de dispositivos de formação de acordo com as necessidades e os problemas identificados;
os consultores, em vez de uma função remetida quase exclusivamente para funções de creditação de produtos de formação, devem, antes de mais, ajudar na identificação dos problemas e necessidades de formação das escolas, bem como colaborar na construção dos dispositivos de formação em parceria com os formadores. Também aqui se coloca uma questão de fidelidade à tutela ou ao seu meio (CFAE). O consultor é do CFAE ou delegado do CCPFC?
as escolas, assumindo uma dinâmica associativa, devem participar na definição de políticas de formação de acordo com um território que partilham e cuja intervenção concertada está na base da própria existência do Centro de Formação, conjugando os seus diversos projectos de formação ou, pelo menos, os problemas que reclamam uma intervenção formativa;
o director deverá reequacionar o papel de mero interface entre as ofertas dos formadores e a suposta procura das escolas e dos professores, implicando-se no trabalho com as escolas através do consultor e da comissão pedagógica e no trabalho da construção dos dispositivos de formação através dos formadores e dos consultores.
4. Tudo isto aponta para uma determinada processologia na construção dos projectos de formação na qual é possível identificar três momentos:
1.º – a definição do quadro da intervenção formativa;
2.º – a construção dos dispositivos de formação;
3.º – a concretização do projecto de formação.
O primeiro momento consiste em definir políticas e identificar problemas que, num determinado quadro espácio-temporal, é pertinente e relevante, justificando, assim, opções tomadas na construção dos dispositivos de formação.
Neste primeiro momento, a comissão pedagógica tem um papel importante na definição de prioridades e orientações, bem como na partilha de informação sobre a realidade de cada escola. Por sua vez, o consultor de formação desempenha uma função crucial no trabalho com os professores e com as escolas, no sentido de substancializar interesses, problemas e necessidades.
No segundo momento, trata-se de responder a um quadro que foi traçado através da construção de dispositivos de formação, o que apela a um saber-fazer “técnico”, no qual devem intervir os formadores e o consultor de formação.
Finalmente, o terceiro momento corresponde à concretização dos dispositivos de formação em acções obedecendo às lógicas de execução decorrentes dos condicionalismos de carácter logístico e humano.
Neste enquadramento, os CFAE ganham identidade e valor próprio se:
1 – Promoverem a formação dos agentes educativos nos âmbitos privilegiados e solicitados pelas escolas associadas e, invertendo a lógica actual, passarem de processos individualizados de formação para intervenções contextualizadas. Ao implicarem um alargado número de intervenientes na resolução de questões significativas para a escola, os centros de formação estão a viabilizar a consolidação de inovações que porventura venham a resultar desses processos formativos.
2 – Dinamizarem formações úteis ao desempenho prático dos docentes e outros responsáveis educativos, por forma a aumentar as hipóteses de actuações com êxito e mutuamente gratificantes;
3 – Assessorarem as escolas associadas na promoção de inovações internas orientadas para a melhoria da qualidade educativa e da organização funcional;
4 – Incentivarem confluências entre escolas no sentido da procura de indicadores significativos e procedimentos válidos para uma correcta avaliação interna orientada para a tomada de decisões destinadas a melhorar a satisfação profissional e a qualidade dos serviços prestados à comunidade escolar. Este tipo de avaliação também é útil para evidenciar necessidades de formação contextualizada.
5 – Promoverem o estudo e investigação de aspectos relevantes da realidade educativa, desenvolvendo nos docentes competências de interpretação e reflexão sobre as suas práticas e experimentando metodologias de trabalho que possam ser objecto de intercâmbio entre escolas de contextos diferentes e transferidas para a organização do trabalho lectivo;
6 – Constituirem um Centro de Recursos Educativos das escolas associadas, em permanente renovação, do qual constem, entre outros:
bibliografias temáticas de âmbito pedagógico-didáctico;
materiais didácticos produzidos nas formações;
relatos de inovações que resultaram de formações promovidas pelo CFAE;
documentação proveniente de intercâmbios com outras instituições.
7 – Promoverem a publicação de trabalhos de carácter didáctico e fizerem circular informação que possa ser útil às escolas associadas.
8 – Se constituirem como parceiros (da(s) tutela(s)) para a auscultação das necessidades de formação no sistema educativo e para a planificação da formação a nível institucional/macro.
Os Centros de Formação encontram-se em fase de consolidação identitária e de reorientação estratégica. Para se afirmarem como instituições credíveis e capazes de desempenhar, com qualidade, a função para que foram criados, precisam de ganhar “densidade” própria e afirmar publicamente o seu mérito e capacidade de intervenção, de modo a ganhar o direito de cidadania perante instituições mais antigas e credibilizadas. Se uma instituição nova não se credibiliza perante os seus utentes e perante a sociedade, revelando maior dinamismo do que as antecessoras, fenece por si mesma.
Pela sua dinâmica interna, têm de responder com flexibilidade e perspicácia às solicitações das escolas e dos professores, garantindo satisfação mútua pela obra realizada.
Lentamente, devem assumir papel activo na investigação de processos didácticos sobre que intervêm e produzir inovações meritórias, fazendo circular o saber construído para que possa aproveitar a outros profissionais e escolas com idênticos problemas (Efeito de Benchmarking).
A avaliação interna dos Centros e as formas de articulação com as escolas da sua área são temas sobre os quais ainda muito há que trabalhar. Eles não podem ser executores submissos de qualquer instância administrativa, nem continuar sujeitos, na sua flexibilidade, a decisões burocráticas que lhes controlam, invisivelmente, todos os movimentos e iniciativas. A principal preocupação deve centrar-se na auscultação atenta das necessidades dos seus utentes e na sua credibilização perante estes. Daí resultará a sua força institucional.
A fragilidade dos CFAE’s reside, entre outras razões, nas suas debilidades organizativo-funcionais que abalam (fragilizam) a sua credibilidade, desvalorizam a sua representatividade e impedem o seu reconhecimento institucional.
Saibamos criar verdadeiras redes de complementaridades, (locais, regionais e nacionais), que promovam a concertação estratégica dos CFAE’s, reforcem a sua credibilização e permitam a sua afirmação como parceiros de facto.
Maia, 23 de Fevereiro de 2000
César Rocha